Pedras de outro continente
A flagrante prática de encarceramento de africanos teve um efeito deprimente em nosso país, deixando não apenas sangue africano nas veias do povo brasileiro, mas também uma contribuição racial que ainda suscita desafios.
Imagem: Lizangela Pinto Siqueira, ano 1997
Existem outros vestígios interessantes em forma de “pedras de calçamento”.
Refiro-me ao lastro dos navios utilizados no tráfico de escravos, feito de pedra proveniente da costa da África. Depois de retornar do Continente africano, os traficantes de escravos usavam essas pedras para equilibrar seus navios, muitas vezes rápidos veleiros que para compensar a falta de peso causada por sua carga humana durante a longa e perigosa travessia do oceano, completavam com pedras, lembro que as pedras de lastr4o eram usadas em todos os navios da época, mas os navios negreiros eram os mais leves, e velozes, então traziam uma maior quantidade de pedras.
Esse lastro nem sempre era descarregado dos navios utilizados no comércio de escravos, pois os navios mercantes também o traziam, mas era raro e, os traficantes de escravos o traziam com maior frequência e constantemente.
Pedras trazidas do além-mar eram transferidas para terra.
No ano de 1721, o Ouvidor Pardinho proibiu em seu artigo 79 o lançamento de pedras de lastro no mar dentro da área do porto, ordenando que fosse lançada em terra e, que os infratores fossem multados em Cr$ 6.000 e, 20 dias de prisão, estipulando que as câmaras provinciais usassem essas pedras para pavimentar as cidades.
Esta posição foi mantida, e como o navio negreiro necessitava de reparos ao final de cada viagem, descarregava seu lastro na hoje (hoje Praça Glicerio).
Imagem: Lizangela Pinto Siqueira, ano 2024.
A propósito na nova viagem à África, os traficantes de escravos também trouxeram lastro, mas como não puderam embarcar novamente no navio, carregaram novo lastro com pedras da ilha da Cotinga e, depois os deixaram na costa africana de Moçambique quando lá executavam reparos no barco para o retorno, faziam novo lastro e, depois carregaram as pedras deixadas no retorno.
Esta é Paranaguá, e não há dúvida de que houve outras cidades no Brasil que estiveram envolvidas no tráfico de escravos até 1830, e todas elas têm uma coisa em comum, paralelepípedos feitos de pedreiras que normalmente não são encontrados em suas localidades, as ruas eram pavimentadas com pedras irregulares.
As pedras no terreno são irregulares e você pode ver belos blocos de granito preto ou verde-preto com listras brancas e outras cores.
Essas pedras vieram da África e foram usadas como lastro em navios à vela.
Ainda hoje no Largo Cel. Glicério ou Praça do Guincho como é conhecida, abaixo de suas calçadas existe o calçamento original feito com estas pedras vindas do além mar.
Imagem: fonte e data desconhecida.
Hamilton Ferreira Sampaio Junior
Referências:
JUNIOR, Nascimento. Pedras de Outro Continente: Revistra Trimestral do Instituto Historico e Geografico de Paranaguá. Pedras de Outro Continente, Paranagua, ano 1, v. 1, n. 1, p. 41, 1 jan. 1932.