Enedina Alves Marques nasceu em 13 de janeiro de 1913 em Curitiba, filha de Paulo Marques e Virgínia Alves Marques, que chegaram a Curitiba nos anos 1910, seus irmãos eram Eraclides, Erondino, Hermes, Enedino e Ernani.
Imagem: Registro de batismo Family Search, 2024
A família teria se radicado no bairro Ahú ou no Portão, bairro onde Dona Duca, como a mãe de Enedina era chamada, ganhava a vida como lavadeira.
Na década de 1920, Dona Duca foi trabalhar para a família do delegado e major Domingos Nascimento Sobrinho.
A casa da família, de madeira, com varandas e lambrequins, foi desmontada e transferida para o Juvevê e, hoje, abriga a sede regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Construção anterior a 1921, a Casa Domingos Nascimento, tem caráter rural e remete ao legado da imigração polonesa em Curitiba.
Domingos, que tinha uma filha de mesma idade, Isabel, mais conhecida como Bebeca, pagou a educação de Enedina em colégios particulares, para que ela fizesse companhia a sua filha.
Entre 1925 e 1926, Enedina foi alfabetizada na Escola Particular da Professora Luiza, dirigida pela professora Luiza Dorfmund.
No ano seguinte, ingressou na Escola Normal, onde permaneceu até 1931.
Imagem: 21 de junho de 1930 Jornal “A Republica”.
Entre 1932 e 1935, formou-se no curso Normal e junto com Isabel, Enedina passa a trabalhar como professora no interior do estado.
Imagem: FamilySearch, Enedina ao lado de suas colegas professoras
Atuou em cidades como Rio Negro, São Mateus do Sul, Cerro Azul e Campo Largo.
Enedina ao lado de outros professores e alunos do Grupo Escolar São Matheus. / FONTE: Gazeta Informativa
Voltou a Curitiba entre 1935 e 1937, para cursar o Madureza no Novo Ateneu (curso intermediário que, na época, era exigido para o magistério).
No mesmo período, Enedina morou com a família do construtor Mathias e com sua esposa Iracema Caron, no bairro do Juvevê.
Durante este período deu aulas no próprio bairro, na Escola de Linha de Tiro.
O amigo Jota Caron, parente do casal, é quem garante a permanência da professora na residência.
Depois dos Nascimento, os Caron se tornam os novos benfeitores de Enedina. Mesmo sem ser formalmente empregada da casa, pagava os préstimos com serviços domésticos.
Em 1935, alugou uma casa na frente do Colégio Nossa Senhora Menina, no Juvevê, e montou classes seriadas de alfabetização.
Imagem: Google, 2020
Em 1938, faz curso complementar em pré-Engenharia no Ginásio Paranaense (hoje Colégio Estadual do Paraná), no período noturno, enquanto morava na casa dos Caron.
Em 1940, ingressou na Faculdade de Engenharia da Universidade do Paraná.
Em 1945, Enedina graduou-se em Engenharia Civil, tornando-se a primeira mulher engenheira do Paraná e a primeira engenheira negra do Brasil.
A formatura se deu no Palácio Avenida, tendo como paraninfo o professor João Moreira Garcez.
Periódico a Republica 1945.
Antes dela, dois negros se formaram em Engenharia na instituição: Otávio Alencar (1918) e Nelson José da Rocha (1938).
Exonerada da Escola da Linha de Tiro em 1946, Enedina se tornou auxiliar de engenharia na Secretaria de Estado de Viação e Obras Públicas.
Enedina foi chefe de hidráulica, chefe da divisão de estatísticas e do serviço de engenharia do Paraná, na Secretaria de Educação e Cultura do Estado.
No ano seguinte, o governador Moisés Lupion, concede transferência para o Departamento Estadual de Águas e Energia Elétrica.
Enedina trabalhou no Plano Hidrelétrico do estado e atuou no aproveitamento das águas dos rios Capivari, Cachoeira e Iguaçu.
Para muitos, a Usina Capivari-Cachoeira foi seu maior feito como engenheira.
Usina Hidrelétrica do Capivari-Cachoeira (renomeada para Usina Pedro Parigot de Souza)
Apesar de vaidosa, Enedina usava macacão nas obras da usina e levava uma arma na cintura, disparando tiros para o alto para se fazer respeitar entre os homens da construção.
Dentre outras de suas obras, destacam-se o Colégio Estadual do Paraná e a Casa do Estudante Universitário de Curitiba.
Um fato marcante no ano de 1950 foi a perda de sua mãe, Nhá Duca.
Imagem:Diário da Tarde 1950.
O major Domingos Nascimento Sobrinho morreu em 1958, deixando Enedina como uma de suas beneficiárias em seu testamento.
Foi entrevistada pelo sociólogo Octávio Ianni em 1961, para a pesquisa “Metamorfoses do escravo”, financiada pela Unesco.
Em 1962, aposenta-se no governo do estado e recebeu o reconhecimento do governador Ney Braga, que por decreto, admitiu os feitos da engenheira e lhe garantiu proventos equivalentes ao salário de um juiz.
Na década de 80 um pouco antes de seu falecimento, juntamente com outras mulheres diplomadas criou uma Associação de Diplomadas Universitárias.
Enedina não se casou ou teve filhos, e seu legado é referência para a história da engenharia civil brasileira.
Seu nome está gravado no Livro do Mérito do Sistema CONFEA/CREA e no Memorial à Mulher Pioneira (Curitiba), ao lado de 53 outras mulheres.
Em 2006, foi criado o Instituto de Mulheres Negras Enedina Alves Marques, em Maringá.
Enedina ousou e lutou para conquistar seu espaço na profissão que desejava – assim como as mulheres ainda precisam fazer, principalmente em áreas tradicionalmente dominadas por homens, como a Engenharia e a Construção Civil.
Esperamos que a história de Enedina Marques continue inspirando mulheres de todo o Brasil a inovar e fazer a diferença na Engenharia.
Enedina morreu em agosto de 1981, aos 68 anos.
Ela foi encontrada morta em seu apartamento na Rua Ermelino de Leão, no Centro de Curitiba, vítima de um infarto no dia 27.
Pelo estado de decomposição do corpo, acredita-se que ela tenha morrido pelo menos uma semana antes, no dia 20.
No atestado de óbito consta a data de 27 de agosto, mas a estimativa é dia 20.
O jornal Diário Popular, tabloide da época, a retratou como uma idosa excêntrica, como se não fosse uma pessoa de importância, o que causou a indignação de membros do Instituto de Engenharia do Paraná.
Após o caso, vários artigos ressaltando seus feitos foram publicados pela imprensa.
Enedina não tinha parentes próximos quando morreu.
Em 1988, uma rua da Vila Oficinas, no bairro Cajuru, foi batizada com o seu nome e Enedina recebeu uma inscrição no Memorial à Mulher Pioneira, local construído pelas Soroptimistas, organização internacional voltada aos direitos humanos, da qual participou.
Em 2006, foi fundado o Instituto de Mulheres Negras Enedina Alves Marques, em Maringá.
Em 2014, uma campanha pela internet pedia que o Edifício Teixeira Soares, ex-RFFSA, adquirido pela UFPR, fosse renomeado em sua homenagem.
Em 2018, placa em homenagem no prédio de Tecnologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Em 2019 a Assembleia Legislativa do Estado do Paraná aprovou o projeto de lei que denomina Engenheira Enedina Alves Marques o trecho da PR 340 entre Cacatu e Cachoeira de Cima, no município de Antonina.
Em 2021. Homenagem para Enedina Marques por Turma da Mônica no Dia Internacional das Mulheres na Engenharia.
Em 2023, o Doodle do Google no Brasil homenageou na data de seu aniversário.
Hamilton Ferreira Sampaio Junior
Referencias:
BANDEIRA, Pura Domingues. Memorial à Mulher: Pioneiras do Paraná (1853-1953). Curitiba: Soroptimist International of the Americas e Prefeitura Municipal de Curitiba. Abril, 2000.
FERNANDES, Sandro Luis. Negra Curitibana em Território de Brancos: Enedina Alves Marques.. 2009. (Apresentação de Trabalho/Comunicação). Seminário de Estudos Étnico-raciais e V Semana de História. História: espaços simbólicos – UNICENTRO (PR).
Negra Enedina, a engenheira. Matéria do Gazeta do povo. Texto publicado na edição impressa de 1 de março de 2013, por José Carlos Fernandes. Visitado em 10 de outubro de 2015.
NICOLAS, Maria. Pioneiras do Brasil: Estado do Paraná. Curitiba: Editora da Autora. 1977.
PUPPI, Ildefonso C. Fatos e reminiscências da Faculdade: Retrospecto da Escola de Engenharia da Universidade Federal do Paraná. Curitiba: Fundação da UFPR. p. 122-123. 1986.
SANTANA, Jorge Luiz. Enedina Alves Marques: A Trajetória da Primeira Engenheira do Sul do País na Faculdade de Engenharia Do Paraná (1940-1945). IN: Revista Vernáculo. n. 28, 2o. sem./2011 Dossiê Estudos Afro-Brasileiros.
SOUZA, Mickaelle Lima. Documentário curta “Além de Tudo, Ela”. COCO filmes, 2019.
CASAGRANDE, Lindamir Salete. Livro juvenil, finalista no Prêmio Jabuti, sobre Enedina Marques 2021. Editora Verso. ISBN: 978-65-86436-86-0.